Hoje, vamos te mostrar, passo a passo, as principais mudanças que fizemos no Debian 13 estável para adaptar o sistema às nossas necessidades de trabalho. É uma espécie de atualização de um guia antigo para o Debian 12, mas agora com várias novidades interessantes: reforço de segurança, um jeito diferente de instalar drivers de vídeo, um novo ambiente gráfico e, principalmente, um ajuste que descobrimos e que deixou o Debian praticamente tão rápido quanto o CachyOS em nossos testes.
Antes de qualquer coisa, é importante alinhar expectativas: nada do que vamos mostrar aqui é o “jeito certo de fazer”. Não é um manual oficial, não é a forma recomendada pela documentação do Debian. É simplesmente o jeito que funcionou por aqui após várias tentativas.
Como é Debian, inevitavelmente acabamos usando bastante o terminal. Então, se você estiver pensando em testar alguma das dicas, a recomendação é: acompanhe o conteúdo até o final, entenda o contexto, e só depois saia copiando comandos. Isso diminui bastante a chance de erro no processo e evita que uma linha digitada no lugar errado estrague o seu sistema.
Drivers, repositórios externos e flatpak
Para chegar a essa configuração, foi necessário reinstalar o Debian 13 algumas vezes. O objetivo foi testar o instalador, ver como ele se comportava com diferentes opções e, principalmente, decidir qual ambiente gráfico faria mais sentido para o fluxo de trabalho.
Após brincar um pouco com as alternativas, fixamos no KDE Plasma como ambiente padrão. Ele equilibra muito bem personalização, recursos avançados e estabilidade.
Mas a parte realmente desafiadora não foi o ambiente gráfico, e sim os drivers NVIDIA e as bibliotecas CUDA. A versão de driver que vem por padrão nos repositórios do Debian simplesmente não atendia o DaVinci Resolve com aceleração adequada. Isso sem contar o impacto em jogos e na experiência com o Wayland.
Usando o repositório oficial da NVIDIA para Debian
A solução que funcionou de forma mais consistente foi usar o repositório oficial da NVIDIA voltado para o Debian. Ao configurá-lo corretamente, o sistema passa a receber versões de driver mais atuais, otimizadas e compatíveis com o stack da própria NVIDIA.
O fluxo geral é o seguinte: primeiro instalamos as dependências que o sistema pode precisar para construir módulos de kernel e lidar com o driver, depois adicionamos o pacote que registra o repositório e a chave da NVIDIA, em seguida configuramos as prioridades do APT para que esses pacotes sejam preferidos, e só então atualizamos e instalamos o driver (e, se for o seu caso, os componentes CUDA).
O primeiro passo é instalar as dependências básicas:
sudo apt install --no-install-recommends dkms libdw-dev clang lld llvm build-essential linux-headers-amd64 pipewire-audio-client-librariesEm seguida, baixamos e instalamos o pacote que configura o repositório da NVIDIA e a keyring de assinatura:
wget https://developer.download.nvidia.com/compute/cuda/repos/debian12/x86_64/cuda-keyring_1.1-1_all.debsudo dpkg -i cuda-keyring_1.1-1_all.deb
Com isso, o Debian passa a conhecer o repositório CUDA, mas ainda não sabe que deve preferir esses pacotes em relação a qualquer outro lugar de onde possa puxar driver NVIDIA. Para resolver isso, criamos um arquivo de preferências do APT em /etc/apt/preferences.d/nvidia-repo:
sudo nano /etc/apt/preferences.d/nvidia-repoE colocamos dentro dele algo assim:
Package: *Pin: origin https://developer.download.nvidia.com
Pin-Priority: 900
Esse arquivo informa ao sistema que qualquer pacote vindo da origem https://developer.download.nvidia.com tem prioridade 900, ou seja, deve ser escolhido no lugar de pacotes equivalentes de outros repositórios, a menos que exista alguma regra ainda mais específica.
Após ajustar isso, basta atualizar o cache e instalar o driver (e, se necessário, os pacotes CUDA):
sudo apt updatesudo apt -y install nvidia-driver cuda-drivers cuda-toolkit
Feito isso, é só reiniciar o computador. Por aqui, o DaVinci Resolve passou a funcionar corretamente, o desempenho em jogos melhorou bastante e o comportamento do sistema com Wayland ficou mais estável.
Todos os comandos exatos necessários estão organizados em um roteiro no GitHub, justamente para evitar que alguém copie algo pela metade e acabe se complicando. A dica é sempre conferir lá antes de rodar no seu sistema.
DebMultimedia: codecs e FFMPEG completo
Outra peça importante desse “FrankenDebian” é o repositório DebMultimedia, utilizamos para instalar codecs proprietários e um FFMPEG mais completo, com suporte a formatos que, muitas vezes, não vêm habilitados na versão dos repositórios oficiais.
O fluxo é semelhante: adicionamos a keyring e depois configuramos o repositório. Primeiro, baixamos e instalamos a chave:
wget https://www.deb-multimedia.org/pool/main/d/deb-multimedia-keyring/deb-multimedia-keyring_2024.9.1_all.debsudo dpkg -i deb-multimedia-keyring_2024.9.1_all.deb
Depois, registramos o repositório no formato moderno, por exemplo em um arquivo de configuração no /etc/apt/sources.list.d:
Types: debURIs: https://www.deb-multimedia.org
Suites: trixie
Components: main non-free
Signed-By: /usr/share/keyrings/deb-multimedia-keyring.pgp
Enabled: yes
Com isso, o sistema passa a enxergar o DebMultimedia como mais uma fonte de pacotes, e você pode instalar codecs e ferramentas multimídia com muito mais liberdade.
Flatpak, Discover e Flathub
Para manter o sistema base relativamente enxuto, instalamos a maior parte dos aplicativos de desktop via Flatpak, sempre que possível. No Debian, essa configuração é simples, mas exige alguns passos.
Primeiro, instalamos o suporte ao Flatpak e o backend de integração com o Discover no Plasma:
sudo apt install flatpak plasma-discover-backend-flatpakEm seguida, adicionamos o Flathub, o qual é o repositório principal de aplicativos Flatpak no desktop Linux:
flatpak remote-add --if-not-exists flathub https://dl.flathub.org/repo/flathub.flatpakrepoDepois que tudo está configurado, vale a pena rodar uma atualização geral e reiniciar:
sudo apt updatesudo apt upgrade
Pode não ser uma boa ideia usar parâmetros que fazem o APT aceitar tudo automaticamente, sem pedir confirmação. Problemas podem acontecer, pacotes podem entrar em conflito, e é melhor ter a oportunidade de recusar alguma atualização problemática do que precisar ficar consertando o sistema depois.
A partir daí, é só instalar os programas que você precisa.
Ajustes no Plasma, firewall e janelas: lapidando o ambiente
Afora personalizações, que dependem de gosto pessoal, temos algumas lapidações que valem a pena fazer no sistema operacional, ou mais especificamente no KDE Plasma.
UFW: um mínimo de proteção é melhor do que nenhuma
Um dos primeiros ajustes essenciais é ativar um firewall. Não é uma solução mágica, mas ter alguma camada de proteção é sempre melhor do que deixar tudo aberto.
No Debian 13, instalar e habilitar o UFW é muito simples:
sudo apt install ufwsudo ufw enable
Com ele ativo, a ideia é liberar apenas o que você realmente precisa. Abaixo, alguns exemplos de serviços que liberamos no firewall.
Para o KDE Connect:
sudo ufw allow 1714:1764/udpsudo ufw allow 1714:1764/tcp
Para o Touch Portal:
sudo ufw allow 12135/tcpPara o Warpinator:
sudo ufw allow 42000:42001/udpsudo ufw allow 42000:42001/tcp
Se você precisar de outras portas, basta ajustar os comandos conforme as aplicações que usa na sua rede local.
E se você preferir evitar o terminal, o próprio módulo de configurações do Plasma tem uma seção dedicada ao firewall, onde você consegue gerenciar essas regras de forma gráfica. O UFW é o motor por trás, e o Plasma funciona como uma interface amigável para ele.

Tiling manual e um quase auto-tiling no Plasma
Um recurso interessante do Plasma é o tiling manual de janelas. Apertando SUPER + T, você ativa um modo em que pode dividir a tela em áreas, criando um layout específico. Depois, basta segurar a tecla Shift e arrastar as janelas para encaixá-las nesses espaços. Para organizar fluxos de trabalho com terminal, navegador, editor de texto e player de vídeo, isso ajuda muito.

Mas algo que faz falta no Plasma é um tiling automático completo, como em ambientes pensados desde o início para isso. O curioso é que o Plasma já tem praticamente todos os recursos necessários, só que eles não trabalham de forma totalmente integrada. Existem scripts do KWin que tentam se aproximar dessa experiência, mas o resultado não nos agradou tanto.
O paliativo foi ativar uma opção de posicionamento de janelas que faz com que cada nova janela seja aberta dividindo a tela em partes, com uma sobreposição mínima. Para isso, no painel de configurações do sistema, vá em Gerenciamento de Janelas, depois em Comportamento de Janelas e, na aba Avançado, ative a opção de posicionamento com Sobreposição mínima.

O efeito prático é que cada nova janela aberta ocupa mais ou menos um quarto da tela, sem cobrir completamente as demais. Não é um tiling automático perfeito, mas é algo como setenta por cento do caminho até lá. Para uso geral, já ajuda bastante a manter tudo organizado.

Como um ajuste simples deixou o Debian (quase) tão rápido quanto o CachyOS
Com tudo configurado, decidimos rodar alguns benchmarks para ver como o sistema se comparava com os resultados de nossos testes com o CachyOS nesta mesma máquina. E aí veio o choque: o Debian estava significativamente mais lento nos testes do Geekbench.

O curioso é que, na prática, a diferença não era percebida. Os jogos rodavam bem, o DaVinci Resolve funcionava na velocidade de sempre e as tarefas diárias aconteciam sem engasgos. Não havia aquela sensação de sistema amarrado. Se a experiência real estava boa, por que o benchmark mostrava um resultado tão ruim?
A máquina em questão usa uma RTX 5070 Ti e um Ryzen 7 5700X, cujo clock chega tranquilamente a 4,6 GHz sob carga pesada. Em jogos e workloads reais, tanto CPU quanto GPU se comportavam como esperado. Mas durante o Geekbench, o processador simplesmente não passava de 3,2 GHz, e às vezes ficava mais baixo ainda.
O Debian é planejado para rodar numa variedade enorme de hardwares diferentes, muitos deles bem mais modestos do que um desktop gamer. Por isso, o projeto costuma adotar configurações conservadoras por padrão, priorizando estabilidade e segurança.
Uma dessas escolhas é justamente o modo de gerenciamento de energia do processador. Em vez de deixar a CPU livre para escalar até o máximo o tempo todo, o sistema tende a usar algo mais próximo de um modo de economia de energia como padrão. Em termos simplificados, isso significa que o processador trabalha nos limites mínimos recomendados pelo fabricante. No caso do Ryzen 7 5700X, estamos falando de algo em torno de 1,2 GHz a 3,2 GHz na maior parte do tempo.
Em notebooks, isso faz bastante sentido: você ganha em temperatura, ruído e duração de bateria. Mas em um desktop, especialmente em situações de benchmark ou renderização pesada, esse tipo de configuração acaba escondendo boa parte do potencial da máquina.
O ideal, para esse tipo de uso, é ter algo mais parecido com um modo ondemand ou balanceado: o processador permanece em frequências mais baixas quando está ocioso, mas sobe até o máximo sempre que uma carga pesada é detectada.
Existem duas formas de corrigir isso. A complicada passa por editar parâmetros de inicialização do kernel, ajustar arquivos de configuração de energia e definir o governador de CPU diretamente para o modo desejado. O jeito simples, que foi o que fizemos, é usar o próprio ícone de gerenciamento de energia na bandeja do Plasma. Bastou abrir esse applet e mudar o perfil para “Balanceado”. O Plasma cuida do resto, ajustando o comportamento da CPU em segundo plano.

Após essa mudança, rodamos novamente o Geekbench. O resultado foi que o desempenho do Debian praticamente empatou com o CachyOS nos testes sintéticos, ao mesmo tempo em que o sistema continuou se comportando bem em tarefas comuns. Ou seja, bastou um ajuste de perfil de energia para desbloquear o desempenho que já estava ali, só que preso por configurações conservadoras.

Se você quiser entender melhor por que usamos o CachyOS como referência de desempenho e até ver algumas comparações diretas entre ele e o Fedora 42, confira nossa análise do sistema!